Paulo Afonso, 23 de abril de 2024

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Pardais, secretários boçais e uma crônica de ouro

Por: Jânio Ferreira

Assim que amanhece, eles chegam vorazes como as nobres excelências em busca das benesses parlamentares. Falo dos pardais, essa espécie de Centrão das cumeeiras, que em franca maioria partem pra cima da ração sem nenhuma consideração pela minoria composta por ternas rolinhas, pacatos bem-te-vis e um simpático casal de cardeais, cuja mãe, carinhosamente alimentando um filhote pelo bico, toda hora é intimidada por um titeludo que parece ser da bancada evangélica, louco pra denunciar “essa vagabunda da cabeça vermelha corrompendo um de menor!”.

Falando nisso, o velho psiquiatra e criminologista italiano Cesare Lombroso ligou-me do além pra me parabenizar. É que mais uma vez adaptei sua tese pra tentar descobrir se diante de mim havia um boçal e, embora tenha demorado, acertei em cheio. Explico.

Tempos atrás participei de uma reunião onde estava o agora ex-secretário de Saúde da Bahia. E sem querer entrar no mérito de sua competência profissional, o que mais me chamou a atenção à época fora sua boçalidade destoando totalmente do que canta Gilberto Gil, já que ali estava o avesso dos trejeitos que Deus costuma dar aos baianos e baianas que fazem por merecer uma caldeirada de lambreta.

Portanto, quando ele perdeu as estribeiras e chamou a chef de cozinha de vagabunda – só por ela não ter aberto seu restaurante para atendê-lo -, finalmente confirmei que por trás daquele terno bem cortado, dos óculos com lentes Zeiss e de uma barba milimetricamente aparada, estava, sim, o lado B de uma triste e desafinada Bahia.

Pra terminar, mais uma da série “Crônicas Que eu Gostaria de Ter Escrito”. Domingo passado, na Folha de São Paulo, Antônio Prata publicou um texto que, pela construção e atualidade, houvesse uma disputa de medalhas na modalidade e certamente teríamos um empolgado Galvão Bueno, gritando: “Pratinha subiu de categoria! Agora é ouro! É ouro do Brasiiiil!”.

Sob o título Dez Versos Livres Com Barreiras, ele simplesmente simulou, com direito a narração e comentários impagáveis, o que seria uma apresentação nas Olimpíadas do jovem Carlos Drummond de Andrade recitando o ainda inédito poema No Meio do Caminho, aquele onde uma pedra insiste em se repetir.

Confesso que desde os tempos de Ivan Lessa, Paulo Francis, Millôr, Sérgio Augusto e Tarso de Castro no Pasquim, depois Ubaldo, Veríssimo, João Pereira Coutinho e outros craques nos jornais e revistas, poucas vezes reli tanto um texto, que além do ouro merecia um troféu no formato das sobrancelhas de Rubem Braga em alto relevo.

No mais, se o golpe do merda-presa for com aqueles caminhões de romeiros escoltado pelo tanque fumacê, nada que as tropas dos generais Marley, Cliff e Tosh não resolvam. E pense no reggae quando o sargento Marcelo D2, com um caminhão carregado de rosquinhas Mabel, berrar: “Moçada, achei o depósito do leite condensado!”.

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